O GLOBO - Informática Etc. - Carlos Alberto Teixeira
Artigo: 1 - Escrito em: 1991-02-20 - Publicado em: 1991-03-04


Computadores, telefone e conversa


Cuidado com os BBS's. Muito cuidado. Poderão se tornar uma mania para você, uma cachaça, uma obsessão. Nossa proposta é desvendar os meandros desta comunidade: usuários apaixonados que, pilotando seus micros e modems, lançam-se noite adentro na ânsia de navegar por estes cativantes sistemas. Lendo, respondendo e comentando mensagens. Pesquisando os extensos bancos de programas. Carrregando e descarregando arquivos. Travando contato com as últimas novidades no mundo da micro-informática. Seus maiores inimigos: o sinal de "ocupado" e o maldito ruído na linha telefônica.

Para começar, definamos "BBS", abreviação de Bulletin Board System, sistema de quadro de avisos em computador. Uns chamam "o BBS", outros "a BBS", outros ainda "o CBBS" (computer BBS). Tanto faz. O fato é que, num belo dia, alguém que dispunha de uma linha telefônica e de um micro decidiu montar um BBS. Passou então a fazer de sua máquina uma central de armazenamento de mensagens e arquivos. Deixou rodando neste micro um programa gerenciador controlando um modem e permitindo ao sistema atender a chamadas telefônicas. Pronto: o BBS estava no ar.

Como usuário possuidor de um micro devidamente envenenado com um programa de comunicação e um modem interno (uma placa adicional instalada em um slot, dentro do gabinete de seu micro) ou externo (uma caixinha cheia de luzes, ligada à sua porta serial), você disca para o telefone do BBS. O sistema atende sua chamada e você logo nota o fato, pois recebe um apito pela cara: a portadora. Segue-se um chiado. Um segundo de silêncio e eis que lhe surge na telinha a linda mensagem: CONNECT. Lá está você. Relaxe agora. Daí para frente passam a conversar, do lado de cá, o seu programa de comunicação e do lado de lá, o programa que gerencia o BBS rodando no micro do filantropo Sysop (system operator, aquele que opera o BBS).

Cada BBS tem vida e personalidade próprias. Na verdade, é a cara do Sysop. Cabe a você, como usuário, conhecer os macetes de cada sistema e dançar conforme a música. Alguns BBS's permitem cadastramento de novos usuários on-line por ocasião da primeira conexão. Outros exigem cadastramento pelo correio. Pagamento? Em terras brasileiras, salvo raríssimas exceções, os BBS's são gratuitos. Naturalmente você terá que pagar pela ligação, como num telefonema comum. Muitos BBS's seguem determinados códigos de ética, segundo os quais deve-se evitar mensagens picantes ou de cunho político ou religioso. Outros são mais liberais, neles fala-se de tudo. Ou quase tudo: palavrões e baixarias jamais.

O perfil do usuário de BBS é extremamente heterogêneo. Grande parte dos bbs-zeiros possui micro em casa, o que já evidencia um poder aquisitivo elevado. Alguns entretanto, transmitem usando os micros da empresa onde trabalham. A faixa etária e o nível cultural destes maníacos também são bem variados. Entre outros, ressaltam-se o grupo dos anciãos, o clube dos yuppies, a horda dos programadores e entortadores de bits, a cúpula dos sábios com soluções para todos os problemas do Mundo, a antro dos literatos e o clã dos fedelhos, estes últimos geralmente mais interessados em joguinhos. O tipo tímido não envia mensagens, mas quase sempre lê as alheias. Outros frequentadores, mais comunicativos, esmeram-se em mensagens elaboradas. Alguns chegam a digitar textos inteiros e carregam-nos nos bancos de programas, efetuando o chamado "upload", ou seja, a transmissão de um arquivo do micro do usuário para o BBS (a operação contrária seria o "download": do BBS para o micro do usuário). Alguns frequentadores chegam ao requinte da especialização, enviando mensagens quase sempre sobre o mesmo tema: loterias, linguagens de programação, comida congelada, contaminação de sistemas por vírus, anedotas, programas compactadores, economia, medicina ou turismo.

Acessar BBS's não pressupõe nenhuma plataforma de hardware em especial. Melhor dizendo, você pode usar um PC, MacIntosh, Amiga, MSX, mainframe, mini ou qualquer tipo de computador. O que importa é que você tenha um modem ligando sua máquina a uma linha telefônica e possua um software de comunicação, que pode ser um programa comercial, ou um software de domínio-público ou mesmo um programa Shareware (tipo use agora e pague depois, se gostar). Os programas não-comerciais, sem dúvida, são os mais usados entre os usuários dos BBS's.

À medida que um novo frequentador vai se tornando conhecido entre os usuários de um sistema, poderá eventualmente ser convidado a participar de uma ou outra "confraria", grupo especial de interesse em que a troca de mensagens se dá em teleconferências separadas do banco contral de mensagens. Aos poucos o neófito vai tomando contato com o jargão típico dos BBS's. O importante é manter sempre o espírito aberto e inquiridor. Não se envergonhe de enviar uma mensagem a um usuário desconhecido, mesmo que seja do tipo: "Prazer em conhecê-lo, mas afinal do que você está falando?". De maneira geral, os bbs-zeiros são extremamente cordiais e solícitos. É frequente uma pergunta ou dúvida colocada no ar sob forma de mensagem pública (aquela a que todos os usuários têm acesso) receber até 10 respostas em menos de 48 horas.

No exterior, particularmente nos EUA, a quantidade de BBS's é simplesmente assombrosa. Muitos Sysops e usuários brasileiros costumam conectar-se a esses sistemas, "baixando" (download) de lá as últimas novidades e por vezes "subindo" (upload) algo novo que tenha sido desenvolvido por aquí. Este intercâmbio internacional, além de ser encorajado pelos Sysops de todo o mundo, é extremamente benéfico para a comunidade.

Em geral, um BBS restringe o tempo de conexão de cada usuário. Uma sessão completa pode durar de 30 a 60 minutos. Caso o usuário não se desconecte antes deste prazo, receberá um aviso. A sessão em andamento é terminada e a linha telefônica do BBS é liberada, permitindo que um novo usuário se conecte ao sistema. Segundo este enfoque, um bbs-zeiro que leia, comente e responda a todas as mensagens durante seu tempo de conexão estará prejudicando outros usuários que, nesse mesmo instante, estarão ligando para o telefone do BBS e recebendo o sempre detestável sinal de ocupado. O procedimento recomendável nos BBS's gratuitos é a captura de novas mensagens e listagens do banco de programas através da gravação das mesmas em arquivos denominados "logs". Explicando melhor: tudo que for surgindo em sua tela vai sendo automaticamente armazenado num log, que nada mais é que um arquivo ASCII simples. O log poderá ser lido após o término da conexão e você terá toda a calma para digitar e editar off-line suas respostas e comentários. Todos os programas de comunicação oferecem esta possibilidade de "logar" uma sessão de BBS. Tendo preparado suas respostas, você voltaria a se conectar ao mesmo BBS, realizando uploads dos textos e mensagens pré-editados.

Vive-se neste momento histórico dos BBS's brasileiros uma nova coqueluche. Trata-se da interligação entre sistemas de diversos estados e por vezes até com BBS's estrangeiras. Deste modo, acessando um BBS carioca, um usuário pode ler e enviar mensagens a colegas em São Paulo, Recife, Argentina ou mesmo EUA e Arábia Saudita.

Em nossa sessão aquí no caderno "Informática etc", você encontrará, semanalmente, uma seleção de mensagens que serão coletadas nos diversos BBS's. Estima-se que, só nos sistemas cariocas, cerca de 1000 a 2000 mensagens são trocadas em uma semana através dos congestionados fios de cobre da Telerj. A tônica dessa enxurrada verbal, como não poderia deixar de ser é a micro-informática. Todavia, fala-se de tudo um pouco.

Além da coletânea de mensagens, iremos abordando diversos temas ligados aos BBS, tais como: programas de comunicação, técnicas de conexão, compactação de arquivos, filosofia do Shareware, garimpagens nos bancos de programas, combate a vírus e por aí vai.

Vamos às mensagens...


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