O GLOBO - Informática Etc. - Carlos Alberto Teixeira
Artigo: 18 - Escrito em: 1991-05-04 - Publicado em: 1991-07-01


Espelho, espelho meu


Um dos primeiros sujeitos que me chamaram a atenção nos BBS's foi um tal de Paulo Pinto, vulgo PSbH. Super atuante e sempre colocando suas opiniões de forma segura e bem estruturada. Mais tarde vim a saber que o Paulo é um bbs-zeiro pioneiro. Conforme já relatamos aquí em nosso retângulo, o PSbH foi o criador do "CBBS do Pinto", o primeiro BBS do Brasil. Foi passando o tempo e cada vez passei a admirar mais este espadachim verbal, com quem costumo travar violentos duelos nos BBS's da vida. Foi a ele que recorrí quando decidí-me a abordar o Mirror III, software de comunicação usado pelo ilustre camarada.

O Paulo começou filosofando, perguntando-se "qual é o mais importante ingrediente do bem-querer?". Poucos pararam para pensar sôbre o assunto, pois, normalmente, não procuramos racionalizar as nossas emoções. Mas acho que muitos leitores concordarão comigo: é o conhecimento. Já ouvi pessoas que diziam que detestavam música clássica (uma tremenda generalização), e foram surpreendidas enquanto assoviavam trechos de uma ária. Antes de abominar, desconheciam.

Você deve estar se perguntando: O que tem este papo furado a ver com um programa de comunicação? Na minha opinião, muito. Existem dezenas, talvez centenas de programas que merecem a nossa consideração. Todos, ou quase todos, têm um núcleo central com funções rigorosamente idênticas. O diálogo com o usuário é feito de várias formas, sendo que as duas principais - linha de comando e menu - admitem combinações em várias dosagens. Qual o melhor? Arrisco uma resposta que certamente não será aceita por muitos: o melhor programa é aquele que você aprendeu a usar, e atende todas as suas necessidades. Hoje, não existe consenso a este respeito. E dificilmente haverá amanhã.

Após este longo preâmbulo, o PSbH passou a descrever seu software de comunicação predileto, mesmo já tendo testado vários outros. A primeira versão do Mirror III já foi um grande sucesso. O primeiro grande "padrão" na área de programa de comunicação foi o Crosstalk, e o Mirror era um clone "envenenado" deste programa. Além de ter todas as funções do Crosstalk (XTalk para os íntimos), o Mirror tinha algumas "features" assaz convenientes, e custava metade do preço. A tela de apresentação era semelhante à do XTalk, e não deve ter sido uma coincidência a escolha do nome da firma: Softklone Distributing Corp., de Tallahassee, Flórida, E.U.A. A segunda versão já fugia um pouco do padrão XTalk, mas continuava extremamente fácil de usar, para quem conhecia o XTalk. Na versão III atingiram o tôpo do Himalaia (nada como a apreciação de um amante).

Já que todos os softwares de comunicação têm um núcleo comum, o que faz um programa mais apreciado do que outro? A resposta é óbvia: as diferenças, também chamadas de "algo mais" pelos aficcionados. No caso do Mirror III, além de funcionar muito bem naquilo que é básico, temos os "algo mais" abaixo relacionados:

1. Possibilidade de comunicação em background. Imagine que você está capturando um grande arquivo num BBS, e recebe a visita de um cliente. Ele está interessado num determinado dado que jaz nas entranhas da sua máquina e terá que esperar até que você termine a captura do arquivo. Isto se você não for um usuário do Mirror, pois ai, bastará apertar simultaneamente as duas teclas <SHIFT>, e você volta à tela do DOS no momento em que chamou o Mirror. A comunicação continua em background, e você pode usar qualquer programa que não compartilhe da mesma porta de comunicação em que está ligado o modem. Existem restrições: você deixa de ter 500+ kbytes para os seus programas, e passa a ter 300+ k. Explico: O Mirror III está operando em modo residente, e usa cerca de 200 kbytes de sua preciosa RAM.

Sobram mais de 300 kbytes, que se não são suficientes para rodar DBase ou AutoCAD, permitem editar um texto com o Norton Editor, ou rodar aquele sistema de controle de aluguel que ocupa grande parte do tempo de seu micro. Alguns rezingantes colegas do ramo dirão: com o Deskview ou o Windows eu faço rigorosamente a mesma coisa, com qualquer programa de comunicação. Mas com o Mirror, você não tem que instalar um programa "gerenciador de memória e de tarefas". Se você estiver usando um AT ou 386, tanto melhor, mas o Mirror funciona excepcionalmente bem num XT, com 640 kbytes e clock de 4.77 MHz (o XT mais lento que já foi fabricado). Quem usa o Mirror, continua com o micro disponível durante as suas comunicações.

2. Grande quantidade de terminais "emulados": O Mirror possibilita emular os terminais ADDS Viewpoint A1, Lear Siegler ADM-3A, Data General D210, IBM 3101 (inclusive "block mode"), TI940 (Texas Instrument 940), Televideo 912C, 920C, 925, Digital VT52, VT100, VT220 e Wyse 50. Permite, como todos os outros a emulação ANSI e TTY. Talvez a lista seja exagerada, mas conforme preconizavam os antigos romanos, se me permitem o cacófato, o que abunda não prejudica.

. Suporte aos principais protocolos de transmissão existentes: O Mirror III suporta internamente os seguintes protocolos: XTalk, Hayes verification protocol (Smartcom), KERMIT, Compuserve Quick-B, single e multi-file YMODEM, YMODEM-G (IMODEM) e as versões single e multi-file do XMODEM. Com a possibilidade de SHELL (voltar ao DOS de dentro do programa), você tem acesso a todos os protocolos externos disponíveis, dos quais os principais são o ZMODEM, o PUMA e o CMODEM, sendo este último software brasileiro, escrito pelo Lávio Pareschi e disponível no CSB BBS. Na nova versão do Mirror III (versão 2.0), temos o ZMODEM incorporado à lista de protocolos internos.

4. Linguagem de programação para suporte à comunicação: Os bons programas de comunicação têm o que se chama uma "script language", ou seja, um linguagem com comandos restritos que permitem gerenciar "unattended" (sem a presença de um operador) uma comunicação. O Mirror também tem esta linguagem, que é tão boa quanto a melhor implementação de seus concorrentes. Para o usuário profissional, ou mesmo um amador sofisticado, oferece uma linguagem chamada PRISM, que lhe permite fazer tudo que imaginou, e mais algumas coisas. Esta linguagem contém todos os comandos mais caros aos apreciadores de linguagens estruturadas, tais como: FOR/NEXT, While/Wend e Repeat/Until. Para quem escreve programas em Basic (QuickBasic) ou Pascal, é extremamente simples e poderosa.

5. BBS disponível para suporte e troca de idéias: A Softklone mantém o "Mirror Information Exchange Bulletin Board" à disposição para clientes e futuros clientes. Lá você encontrará um grande número de "script files" e programas em PRISM, para uma ampla gama de situações. O telefone é 001-(904)-878-9884. Nem tente chamar se você não tiver um modem com correção de erros (MNP-5 ou V42bis), pois como sabemos a linha de nossa TELERJ é otima, mas a da AT&T é cheia de ruído...

Se o Mirror III é tão bom, então por que tem pouquissimos usuários aqui no Brasil? A resposta é simples: o brasileiro inventou a frase "não vi e não gostei". Além do mais, o programa não é comercializado no país. Se você acha que um dos "algo mais" apontados é importante, faça um teste com o programa. O pequeno investimento na rápida leitura do manual, poderá lhe trazer grandes recompensas.


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