O GLOBO - Informática Etc. -
Carlos Alberto Teixeira
Artigo:
136
- Escrito em:
1993-10-20
-
Publicado em:
1993-10-25
Como apagar memória
O amigo BBSzeiro, como todo usuário de micro, conhece muito bem a arte de deletar arquivos. Seja em winchester, disquete, fita streamer, disco ótico, ou qualquer outro meio. Naturalmente, usa o comando "del" ou similar. Talvez também já tenha usado os famosos COMANDOS DE APAGAMENTO REAL tipo WIPEFILE do Norton ou coisa que o valha. E quem sabe já tenha até usado um daqueles grandes e poderosos ímãs ou algum outro "hardware bulk eraser" que apaga indelevelmente qualquer informação de uma superfície magnetizada. Mas e a memória? Não estou falando da memória RAM, aquela que fica nos seus queridos chips. Refiro-me à outra que está no interior do seu quengo, ativa e pulsante dentro do maravilhoso computador que é o cérebro. Alguma vez já conseguiu apagar algum trecho desta mamória?
Quarta-feira, 13 de outubro corrente, participei de uma interessante experiência de apagamento de memória e posso até me atrever a dar algumas instruções ao leitor que quiser seguí-las. Naturalmente eximo-me de qualquer responsabilidade, pois a rígida observância a estas instruções poderá eventualmente causar-lhe alguma dor, além de prejuízos materiais. Para apagar a sua memória criando uma janela de aproximadamente 8 horas de escuridão quase completa, pilote uma motocicleta e jogue-a contra o meio-fio de um canteiro gramado de separação de pistas a mais de 80 por hora, usando capacete, é claro. Sua moto vai voar, quicará uma ou duas vezes e, quando aterrisar, no estabaco, você provavelmente terá conseguido apagar um bom pedaço de suas lembranças daquele dia.
Nem preciso falar das outras conseqüências dessa experiência que, no meu caso, foi obviamente involuntária. Mas mesmo não precisando vou enumerá-las: ante-braço direito esmigalhado em vários pedacinhos, ombro deslocado com a cápsula do úmero chegando quase até a orelha, manchas roxas na parte sul do corpo, dor muscular generalizada com intensidade redobrada nas ilhargas e, para completar, o moral lá embaixo. A sensação de ter sua memória apagada num acidente deste tipo é quase tão desesperadora quanto a colisão em sí. Você fica se concentrando feito louco tentando reviver fagulhas da memória, mas nada vem à tona. Esta CPU maravilhosa que temos dentro da cachola, dispõe de mecanismos de auto-preservação com que nem sequer sonhamos. O impacto, a dor e as sensações, no meu caso, devem ter sido tão violentos que a CPU apressou-se em preservar o resto do hardware de recordações tão amargas.
E aqui estou eu, ditando este BBS-Mania por telefone para alguém muito especial que se dispôs a digitá-lo para mim. O apoio que venho recebendo dos muitos colegas de BBS é algo realmente comovente e que dá muito mais força para suportar esta barra. Isto sem contar com a tristeza de não poder sentar ao micro toda noite e acessar os queridos boards da cidade, lendo, escrevendo e me divertindo com os papos que rolam nos BBS. No momento aguardo uma segunda cirurgia que vai, espero, reconstituir o cúbito esfarelado. No entanto, bem brevemente já estarei de volta ao micro, retomando minhas atividades normais. Já aventei a possibilidade de trazer um laptop aqui pro hospital, mas a simples verbalização desta idéia fez com que meus familiares quase me surrassem. Sou grandalhão, mas como estou enfaixado, dolorido e cheio de tubinhos, não pude oferecer resistência ao pessoal.
Agradeço aos colegas que tão carinhosa e solidariamente me enviaram mensagens de apoio e desculpo-me por não tê-las podido "replyar" tão rapidamente quanto gostaria. Como lição aprendida do lamentável ocorrido, parece-me oportuno sugerir ao leitor que aproveite ao máximo o privilégio de tamborilar seus dedos neste seu maravilhoso teclado, empunhar despreocupadamente seu mouse, manipular agilmente seus disquetes e CD-ROMs. Ver-me privado destas liberdades é algo um tanto triste, mas graças a Deus logo logo estarei de volta. E lembre-se: moto faz mal a saúde, mas para apagar memória, não conheço nada igual.
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