O GLOBO - Informática Etc. - Carlos Alberto Teixeira
Artigo: 212 - Escrito em: 1995-04-11 - Publicado em: 1995-04-17


Acontece nas melhores famílias


Equilibrar-se na ponta da tecnologia tem lá suas consequências, umas boas outras não. Esse contato com o que há de mais novo em informática sempre proporciona emoções fortes ao usuário. Foi o que ocorreu com um colega nosso que prefere se manter incógnito, mais uma vítima da promiscuidade digital. Freqüentador assíduo do IRC (Internet Relay Chat), passava horas nos antros de pirataria, os herméticos canais "warez" da vida. Nestas criptas lúgubres, os piratas se reúnem e trocam mensagens em tempo real sobre os mais diversos assuntos relacionados à pirataria de software comercial. Discutem todo tipo de crack de programa, sites clandestinos na rede, acessos não-autorizados a repositórios de arquivos, em suma, tudo que é proibido na Internet. A faixa etária dos waristas é dos 17 aos 22, seu jargão é típico e o linguajar é monossilábico e "gutural", como o da dupla de papalvos Beavis and Butthead da MTV. Muitos dos canais "warez" são fechados aos não-iniciados. Para neles entrar é preciso ser convidado, o que por si só já é uma barreira quase intransponível pois, diante da recente captura de alguns piratas por agentes da lei infiltrados no submundo, os infratores ficaram "jumpy", ou seja, extremamente cuidadosos e atentos.

Mas nosso colega já fazia parte do grupelho de traficantes de software e participava ativamente da troca de "favores". Constitui prática comum nos canais "warez" o oferecimento público de pacotes piratas, normalmente joguinhos crackeados. Diante da oferta, o pessoal arregala os olhos e apressa-se em copiar a penca de imagens de disquetes compactados, através de um protocolo chamado DCC (Direct Client Connection), que permite que usuários IRC troquem arquivos em background, enquanto continuam seu colóquio digital.

Nesse afã de baixar megas e megas por dia, nosso infeliz colega acumulou uns 40 megas de warez e decidiu-se a passar um fim de semana só deszipando (descompactando) os pacotes trazidos, analisando-os, testando e guardando a muamba em sua biblioteca de fitas. É claro que, macaco velho, jamais rodava um software desconhecido sem antes submetê-lo ao crivo dos anti-virus. Primeiro rodava o SCAN da McAfee. Depois, por precaução, rodava o F-PROT do Frisk. Só então, crente que estava limpo, rodava o programa pirateado e deliciava-se na poltrona.

Mas sua máquina repentinamente apresentou sinais de defeito. Parecia coisa de hardware, problema com chips de memória. A máquina começou a travar e a comportar-se estranhamente. Desconfiado, repassou o anti-virus F-PROT em modo heurístico, de alta sensibilidade: nada. Chamou um especialista de hardware para ver a máquina e atestou que nada havia de errado como equipamento. Resolveu insistir na possibilidade de estar infectado e, por sugestão do hardwarista, experimentou o programa anti-virus ThunderByte (TBAV), também em modo heurístico. Para estupefação total, o TBAV acusou anomalias no sistema. Não conseguiu identificar um vírus específico, mas achou que algo fedia. Começou então uma perseguição ao nefasto organismo, checando cada setor de boot e cada programa executável. O vírus desconhecido era mais esperto do que pensavam, pois conhecia intimamente cada um dos programas anti-virus que eram executados. Contaminou o SCAN, contaminou o F-PROT e tentou contaminar o TBAV. Quando o vírus percebeu que não conseguiria afetar este último, pois o TBAV havia sido instalado com todas os opcionais e módulos residentes, resolveu chutar o pau da barraca e saiu contaminando todos os executáveis dos dois hard-disks do pobre mancebo. Catástrofe geral: teve que reformatar tudo.

O vírus que pegou de jeito nosso infeliz colega devia ser um daqueles fresquinhos, mutantes e polimórficos, recém-saídos do forno. Nenhum anti-virus pode identificá-lo, pois era novo demais. Sem dúvida uma primorosa peça maligna de software, feito por quem entendia a fundo da arquitetura dessas máquinas. Nossa enfurecida vítima ficou uma semana sem ligar o micro. Depois, já refeito do trauma, conseguiu isolar o vírus a partir de alguns dos arquivos infectados, botou o sistema em ordem e, da última vez que falei com ele, estava se preparando para enviar, via e-mail, o pacote isolado para os especialistas anti-virus que imediatamente produzirão a vacina contra o hediondo ser.

Detalhezinho: nosso anti-herói não desgruda mais do TBAV e, para pasmo geral, pensa até em registrar o software.


ALTA DENSIDADE: Alguns newsgroups da Usenet primam por produzirem em seus leitores caretas de pasmo. Num deles foi recentemente anunciada uma técnica digital capaz de armazenar 375 novelas literárias de tamanho médio em uma polegada quadrada, ou seja, o correspondente a uma pilha de papéis da altura de um prédio de cinco andares. A novíssima tecnologia de gravação digital divulgada recentemente pela IBM oferece densidades de 3 Gigabits por polegada quadrada. Os magos da Big Blue estimam por baixo um assombroso empacotamento, disponibizando as novas altas densidades em disquinhos de 3,4 Gigabytes em dois pratos de 2,5 polegadas, ou então em unidades de 20 Gigas num drive de 3,5 polegadas. Os zilhões de bits respousam num filme fino de liga de cobalto, sobre um prato de alumínio e protegido por uma película resistente protetora. A cabeça da unidade usa um elemento indutivo para escrita, um elemento magneto-resistivo para leitura e já possibilitou taxas de transferência de até 4 Megabytes por segundo. O grande babado deste cabeçote magneto-resistivo é o fato de não ser afetado pela velocidade do pratinho que roda embaixo de si. A explicação dos cientistas é simples, mas envolve velocidades angulares e relações entre sinais digitais e não estamos aqui pra isso. Item curioso é a distância entre a cabeça e a superfície do disco: dois milionésimos de polegada. Os técnicos da IBM juram de pé junto que a própria luz visível mal consegue passar por fenda tão estreita. O que nos interessa mesmo é saber quando é que colocaremos as mãos nessas maravilhas da ciência. Dizem os azulzões que entre 1998 e 2000 já estarão nas lojinhas.


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