O GLOBO - Informática Etc. - Carlos Alberto Teixeira
Artigo: 224 - Escrito em: 1995-07-07 - Publicado em: 1995-07-10


Vê se pega leve, Unabomber


É possível que a leitora não esteja a par das ameaças do Unabomber e nem saiba de quem se trata. Bem, na verdade ninguém sabe quem é o cara pois, para sua própria sobrevivência, ele se mantém incógnito. Há dezessete anos esse execrável personagem vem praticando atos terroristas pela bandeira da anti-tecnologia. Já matou algumas pessoas e feriu muitas. Recentemente ameaçou explodir mais um petardo caso não fosse aceito seu "pedido" de publicar em grandes jornais nos EUA, um manifesto de mais de 50 páginas explicando sua doutrina anti-tecnológica. Em que pé ficou esta encrenca, até agora não se sabe (leia-se agora como sendo quinta-feira passada, quando escrevi isto). Pode ser que hoje o Unabomber já tenha detonado sua carga, ou esteja preso, ou tenha tido seu manifesto publicado, sabe lá?

Em muitos newsgroups da Usenet o assunto fez os threads (encadeamentos de mensagens mais ou menos sobre um mesmo assunto) pegarem fogo. Todos desprezam os métodos do Unabomber, mas muitos abriram os olhos para a mensagem que ele traz: até que ponto a tecnologia por si só é coisa boa? Deve fazer parte de nossas vidas tão intensamente como vem ocorrendo ultimamente? Alguém já mediu e analisou os efeitos desse boom tecnológico sobre o humano médio?

Muitos autores de posts na Usenet fazem questão de enriquecer seus artigos com citações de autores e pensadores famosos em um determinado ramo do saber. Os anti-tecnologistas não se cansam de citar Jerry Mander e seus livros: Four Arguments for the Elimination of Television (Quatro Argumentos para a Eliminação da Televisão) e In the Absence of the Sacred (Na Ausência do Sagrado), ambos da Sierra Club Books, de São Francisco, EUA. Quem quiser encomenda-los via Internet, é só dar um telnet para books.com. Tenha seu número de cartão de crédito internacional à mão e navegue pelos menus auto-explicativos desse site. A entrega é feita em oito semanas. Por sorte, um amigo emprestou ambos os livros para o Cat, que já engoliu o primeiro e está mastigando o segundo, do qual apenas as partes um e dois se relacionam diretamente ao tema.

Pregar radicalmente a anti-tecnologia é um tanto exagerado. Afinal, por exemplo, como poderia este texto escrito à mão ao lado das linhas férreas em Barra do Piraí, chegar em poucos segundos à redação do Caderninho, onde a Cris já estava preparando um despacho de galinha morta com farofa amarela e ovo cozido, maldizendo o atraso do colunista? Só mesmo via fax, santo fax. É claro que muitos dos avanços tecnológicos têm algo de bom a oferecer. Mas segundo alguns, o somatório final só é positivo para uns poucos: os mesmos de sempre, é claro.

E quando o assunto cai para o lado dos perigos dos computadores, tanto para quem trabalha com eles, quanto para os que passam a depender de dados por eles processados, aí a coisa é de arrepiar os cabelos. Já sei que quando voltar, vou olhar para o Blazugro (nome do meu micro) meio de banda.

Se a leitora domina inglês, os livros recomendados acima dão um verdadeiro banho de informação sobre a matéria. Caso contrário, a menos que uma editora se interesse, só nos resta esperar até que apareça algum herói como o Vitorino Santos, que traduziu o "Turn off your TV" voluntariamente.

Porém, o mais interessante é observar quantos anti-tecnologistas saíram da toca nas discussões na Usenet. Muitos cientistas e muita gente da tecnologia de ponta está emitindo pesadas opiniões anti-hightech. É quase inacreditável. E, pela lei do espalhamento universal, os assuntos vão divergindo um pouco do thread original, mas geralmente mantêm a questão em pauta. Muitas comparações são feitas entre o estilo de vida atual e o do passado e com o quanto se distanciaram de si mesmos e de seus semelhantes os usuários pesados da tecnologia. Diante da promessa antiga de que as novas técnicas iriam melhorar a qualidade de vida da Humanidade, o que se vê é um aumento da incidência de crimes, prisioneiros, suicídios, uso de drogas, pobreza, desnutrição, gente sem-teto, analfabetismo e doenças mentais. E isso tudo não é na Jamaica não: é no Titio mesmo. Maginaqui. Alguns entusiastas estão coletando esses artigos da Usenet e preparam para setembro próximo uma palestra aqui no Rio sobre o assunto. Data, hora e tema serão divulgados aqui. Aguarde.


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