O GLOBO - Informática Etc. - Carlos Alberto Teixeira
Artigo: 258 - Escrito em: 1996-08-02 - Publicado em: 1996-08-05


Perdí meus óculos


ATENÇÃO: VOLTO ATRÁS. EU NÃO RECOMENDO OS SERVIÇOS DO DR. ANTONIO LOBO, NEM A CIRURGIA. ESTOU COM 8 E 7 DIOPTRIAS EM 10/02/98

- c.a.t.


Esse pessoal que tem mania de falar mal do progresso tecnológico, olho nessa gentalha. Garganteiam que todo esse avanço é maligno, sobem nas tamancas, fazem, acontecem, mas na hora agá acabam apelando mesmo para a high-tech. E, cá entre nós, nego atualmente está fazendo coisa que há pouco tempo pareceria milagre. Hoje mesmo, estava eu no chuveiro, olhei para baixo e fiquei impressionado com o que ví. (A leitora pensou besteira, mas não é nada disso.) Míope desde moleque, vinha usando óculos até há poucas semanas, vidrões de 6,5 dioptrias. E hoje, no banho, que ótima surpresa ao me tocar que enxergo meus pés lá embaixo, quase nítidos. A leitora que tem boa visão nem liga pros seus pezinhos todo dia pisando o box, mas o ex-cegueta aqui, ah que alegria, que bela visão.

Conto a história inteira, pois ilustra uma bela aplicação informática. Um sucesso, espero. Foi num almoço com velhos colegas de BBS. Um deles, Carlindo Costa, me disse que era míope daqueles brabos e que hoje enxerga perfeitamente sem óculos nem lentes. Indicou-me um doutor que opera miopia com raio laser. Um arrepio me percorreu a espinha, mas peguei o número do homem e fui à luta. Consulta feita, córneas aprovadas nos testes preliminares, e preço acertado. Peguei uma grana que vinha economizando para incrementar minha máquina lá em casa e resolví investir nesse outro, digamos, upgrade de hardware. Marquei para 12 de julho, as duas vistas na mesma leva.

No dia e hora aprazados, família roendo unha na sala de espera, sentei-me diante de um artefato daqueles típicos de filme de ficção científica. A engenhoca em cujas entranhas enfiei a fuça chama-se EH-270, da empresa Visioptic Inc. Na verdade é um PC envenenado rodando um software de nome Eye-Map 3.7. O captador de dados é uma espécie de olho-sonda eletrônico, uma cavidade cônica enfeitada com dezenas de círculos luminosos coaxiais. As imagens destes círculos de luz refletiam em cada um dos meus olhos e a danada da maquininha pôde com isso gerar um minucioso mapa topográfico tridimensional das minhas córneas. Produziu lindos gráficos multicoloridos, com curvas de nível, displays e tabelinhas mil, gravando tudo isso num pequeno DataCard, do tamanho e formato dum cartão de crédito. Sua superfície se parece com a de um CD-ROM e, segundo me disseram, é capaz de armazenar uma barbaridade de não-sei-quantos megabytes, folgadamente.

Topografia capturada, puseram-me para aguardar o momento da intervenção, quando passei duros minutos assistindo às operações dos meus colegas de aventura, numa TV na sala de espera. O cara pode ser valente, mas nessa hora, desce aquele suorzinho na testa, não tem jeito. Como havia um vídeo conectado ao monitor, arranjamos uma fita e providenciamos a gravação da farra.

O tal DataCard foi despachado para a sala nobre, visando alimentar de dados a "britadeira" laser computadorizada, sob a qual sentei- me logo depois, engolindo em sêco. Uns pinguinhos de colírio anestésico, acomodaram-me debaixo do canhão e em seis minutos estava tudo safo. Nem deu tempo para chilique. Antes, para evitar aquela piscadela fatal, prenderam-me as pálpebras com delicados ganchos e mandaram que olhasse fixamente para um pontinho vermelho. Ouví umas dezenas de suaves tec-tec-tec, tipo barulho de descarga elétrica e sentí cheiro de bife queimado. Eram minhas córneas levando precisos tiros de laser. Não levei ponto e não precisou de curativo nem tapa-olho: só me lambuzaram os olhos com uma gosminha, puseram-me um par de lentes de contato gelatinosas e já saí da sala enxergando melhor. Fiquei uns três dias meio de molho, paparicado pela Astrid, sentindo alguma dorzinha e certo incômodo em locais com muita luz. Mas depois disso, tirei as lentes protetoras e retomei vida quase normal, sofrendo apenas um já esperado embaçamento na visão. Mas tem que ter paciência, pois disse o médico que só depois de três meses o foco ficará o fino. Se não zerar a miopia, chegará bem pertinho disso.

Por ora, já pedalo a Aranha na ciclovia, dirijo, interneteio, vou ao cinema e nem parei o intensivo de Alemão. Os óculos estão esquecidos em alguma gaveta aqui, nem sei. Mas, putsgrila, não consigo esquecer aqueles pezões que ví no chuveiro, baita emoção. Daqui a três meses eu conto o quão perto do zero eu cheguei, mas enquanto isso, se a leitora também usa fundo-de-garrafa, anote logo o telefone do santo, o Dr. Antônio Lobo: XXX-XXXX.


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