O GLOBO - Informática Etc. - Carlos Alberto Teixeira
Artigo: 283 - Escrito em: 1997-01-21 - Publicado em: 1997-01-27


A segunda onda


A leitora decerto já havia notado, mas agora eu confesso: sou um retardado. Porém nem me incomodo e até me orgulho dessa condição. Ficar sempre na crista da onda em coisas de informática, você sabe muito bem: é caro, muito caro. É por esse motivo que alguns usuários adotaram o hábito de estar sempre um pouquinho atrasados em relação à onda. Suas máquinas são sempre mais lentas, seus discos são menores, possuem menos memória e rodam sempre versões antigas de software. É verdade que o status fica prejudicado, mas o bolso fica bem contentinho e a vida micreira transcorre sem sobressaltos. Na hora da livraria é outro chuá. Nada de manuais nem livros sobre o que está sendo lançado já. Vamos aos livros obsoletos, aqueles que ficam na prateleira dos saldos. Fico rindo à toa com os preços que encontro. De vez em quando, naturalmente, bate uma invejinha dos atualizados, mas é coisa passageira. É só lembrar de quanta coisa boa a gente fazia nos tempos do XT com clock de 4,77 MHz e 10 megas de winchester.

Os amigos falam de seus novos brinquedos, versões tinindo de novas, e às vezes dá até vontade de entrar na dança de novo. Mas depois você ouve falar nas dificuldades, decepções, bugs, incompatibilidades e todo tipo de encrenca. A vantagem de quem navega na segunda onda é que só vai pegando condições estabilizadas, só o que já foi testado, verificado e aprovado. Aconteceu comigo isso mesmo, com relação aos meios de armazenamento de massa, mais especificamente o Zip Drive da Iomega. Quando me falaram num tal disquetinho que engolia 100 megas e cujo drive se pendurava na porta paralela, eu quase não acreditei. Imaginei toda minha coleção de disquetes antigos cabendo em um ou dois desses discos mágicos. Backups completos com a maior facilidade. Softwares inteiros instalados em discos removíveis. E mais a possibilidade de andar com o drive numa sacolinha e poder plugá-lo na paralela de um amigo em 1 minuto. Era um sonho. Atualmente um zip-disk já engole 1 Gigabyte, mas continuo com o meu drive de 100 meguinhas mesmo. Dá e sobra, pelo menos por enquanto.

Depois que me enturmei com o pessoal que já era craque nas zip-disquices da vida, logo dei de cara com as fabulosas repercussões dessa tendência. Lembra a leitora dos tempos em que, para copiar um software na casa dum amigo bastava levar uma ou duas caixinhas de disquetes de 1.44 Mb? Tempo bom aquele. Depois que começaram a agigantar os programas, lançando-os em CD-ROM, a mania do intercâmbio indiscriminado ficou bem prejudicada.

Mas só por pouco tempo. A turma não fica quieta e parece que a sorte está com eles. Despencam os preços dos gravadores de CD-ROM e os zip-disks estão aí à vontade no mercado. Verdadeiras fraternidades de piratas de software, geralmente localizadas na Rússia, Bulgária e adjacências, especializaram-se em distribuir software comercial, devidamente crackeado e operante, em CD-ROM's e preço de banana. Junte-se a isso a poderosa Internet, com seus sites de FTP e FSP piratas, diretórios-fantasma, newsgroups de binários na Usenet e as vigorosas trocas de arquivos via DCC nos canais de IRC e temos uma rede mundial de tráfico de programas. Segundo os conhecedores do ramo, é possível comprar CD-ROM's piratas aqui no Brasil por menos de US$ 50, contendo tudo que você imaginar em termos de software. Nas rodas dos apreciadores de logiciários comerciais, quando alguém põe as mãos numa dessas novidades, logo chovem zip-disks de todo lado para abrigar as volumosas peças recém-chegadas. O pessoal marca um churrasco e cada um chega com 3 ou 4 Gigabytes de espaço livre no bolso. Ao final do repasto, discos cheios, é hora de ir para o micro descamar e limpar os peixes.

Tommy, um micreiro alemão de Hannover veio visitar amigos aqui no Rio e ficou boquiaberto com a facilidade de se obter títulos comerciais piratas. Basta abrir qualquer classificado, ligar, escolher, fazer o pedido e receber em casa no dia seguinte programas que custariam dezenas de milhares de dólares numa loja oficial. Segundo o gringo, é impossível uma moleza dessas lá em cima. Só muito na encolha, pagando alto, correndo sério risco de ir preso e possuindo contatos muito muito especiais. Ficou tão abalado com o que aqui encontrou, que chegou a pensar em se mudar para cá. E olha que ainda nem levaram o cara para almoçar numa churrascaria e ver show de mulata.


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