O GLOBO - Informática Etc. - Carlos Alberto Teixeira
Artigo: 381 - Escrito em: 1998-12-08 - Publicado em: 1998-12-14


Drama virtual


Triângulo amoroso via Rede acaba provando ser um polígono

A Internet está cheia de histórias de amor e ódio. Uma grande amiga minha acabou sem querer tomando parte numa delas. Ela mesma nos conta o que se passou:

"Há coisa de uma semana, tarde da noite, ligou-me uma jovem com uma história de arrepiar os cabelos. Estava fungando e com a voz rouca. Vou chamá-la aqui de Cris, mas obviamente o nome dela não é esse. Ela disse que não me conhecia e nem eu a ela. Viu meu telefone na sig de alguma mensagem que enviei para minha lista de amigos, pobres coitados que recebem textos que considero interessantes, links e piadinhas que envio via e-mail. Essa mensagem minha que ela leu estava na mailbox do namorado, à qual ela tinha acesso, pois havia descoberto a senha do rapaz. A Cris por algum motivo resolveu se abrir comigo, talvez por eu também ser mulher, e começou a me contar seu drama pessoal, desmanchando-se em lágrimas ao telefone e quase me matando de pena. Tinha 17 anos quando começou a namorar esse sujeito que chamarei de Lobo, ele na época com 25. Foi o primeiro, grande e único amor da vida dela, até hoje.

Ao longo de quatro anos de namoro, ela teve indícios fortes de que o camarada é um grande galinha. Há poucas semanas descobriu por acidente, na secretária eletrônica do Lobo, um recado apaixonado de uma outra chamando-o de meu amor, marcando novo encontro e deixando um telefone. Foi a gota d'água: Cris deletou o Lobo no ato, mesmo amando-o profundamente. Sofrendo horrores, resolveu procurar algo que a fizesse sofrer ainda mais, como sói acontecer com algumas donzelas como nós, em situação similar. E lá foi ela, fuçar as mensagens do Lobo no servidor de e-mails dele via Web. Depois de tentar algumas senhas prováveis, encontrou a password correta: "cris", evidência clara de que o Lobo gostava mesmo dela, pelo menos um tanto. Leu uma mensagem, leu duas e lá pelas tantas, o choque. Uma tal de Lisa estava trocando e-mails apaixonados com ele. Morando na Alemanha, a Lisa estava de viagem marcada para o Rio dentro de alguns dias e naturalmente haveria um encontro maravilhoso e apaixonado dos dois. Talvez viesse a ser até um reencontro, diante dos elementos que a Cris colheu na fogosa troca de mensagens, evidenciando já haver considerável intimidade entre eles. Foi o suficiente para fazer desabar essa jovem de 21 anos, apaixonada, super fiel, amando loucamente e agora decepcionada com seu Lobão, o homem que queria junto de si para sempre. No meio de soluços de partir o coração, a guria mal conseguia falar comigo ao telefone. Pedi que ficasse quieta e me ouvisse. Acho que foram mais de 40 minutos de falatório que joguei em cima dela, contando casos parecidos, dando conselhos e tentando levar um bocado de luz naquele momento tão difícil. A Cris falou que dali para frente iria odiar os homens, pois eram todos cafajestes e canalhas. Não adiantava eu contra-argumentar naquele instante, e acho que nem poderia, pois não discordo inteiramente dela. Apenas disse que essa sensação iria perdurar por alguns meses apenas e que, quando ela menos esperasse, iria encontrar um cara bacana e digno. Espero que ela tenha essa sorte.

Pois bem, dei pra ela mais uns toques, umas dicas, sugeri que tirasse o Lobo da cabeça e que recomeçasse a viver. Recomendei também que, ao desligar o fone, fosse chorar debaixo do chuveiro ligado, uma boa manobra, pois fica parecendo que você está chorando dezenas de litros de lágrimas, o que intensifica sobremaneira a sensação de desafogo. Ela desligou e fiquei sem contato com a pobre Cris.

Dias depois, já enfiada novamente no trabalho, baixei minhas mensagens novas e, qual minha surpresa! A Lisa, sim aquela mesma Lisa, de algum jeito estava recebendo as mensagens endereçadas à minha lista pessoal. Vasculhei minha relação de destinatários mas não encontrei nem o nome nem o e-mail dela. Provavelmente usava um redirecionador de mensagens ou coisa que o valha. Ou então era mais uma ocorrência do comum fenômeno do 'forward do forward do forward', em que uma pessoa encaminha a outra certa mensagem que considerou interessante, proveniente de outro encaminhamento anterior, criando um encadeamento do 'forwards' com origem muitas vezes desconhecida.

Peguei o e-mail da Lisa e resolvi me meter na confusão. Mandei para ela uma mensagem anônima, informando-a em detalhes sobre o namoro do Lobo com a Cris e sobre o fato de o cara ser um safado. Avisei também que a Cris já sabia da viagem dela da Alemanha para se encontrar com o Lobo, e que ela estava completamente arrasada e no máximo do desespero. Exortei-a a dar uma bela lição no desgraçado. E pronto, achava que já tinha feito a minha parte. Pois bem, poucas horas depois de eu ter mandado o e-mail incógnito, a Cris me ligou aos prantos. Ela havia novamente lido as mensagens do Lobo e constatado que a Lisa havia dado um reply para a tal mensagem anônima (a minha), com cópia para o próprio Casanova. Cris leu para mim o reply da sua rival e me pareceu que a Lisa está querendo mesmo coisa séria com o rapaz. Bem, agora nem sei se está ou estava, diante das revelações que recebeu. Dentro de alguns dias vai haver o grande encontro, vamos ver no que dá."

A história está nesse pé. Possivelmente, nesse exato instante em que a leitora acompanha este drama internauta, a Lisa já esteja junto do Lobo aqui no Rio. Resta saber se ela vai assumir o cara galinhão do jeito que é ou se vai dar-lhe uma bela escovada. Não percam o próximo episódio.


[ Voltar ]