O GLOBO -
Informática Etc. - Carlos Alberto Teixeira
Artigo: 406 - Escrito em: 1999-06-02 -
Publicado em: 1999-06-07
THE MATRIX
Se você não assistir esse filme, não brinco mais com você
É comum em e-mails de lista, spams e em newsgroups, mensagens intituladas *SPOILERS*, contando o final de um filme, detalhes inéditos dum show, o desfecho de um livro ou quebrando o suspense de alguma coisa. Quem escreve um spoiler sem declará-lo abertamente como tal, acaba angariando puro ódio de quem gostaria de curtir as descobertas da peça artística naturalmente, em ritmo suave. Portanto, declaro este artigo um genuíno spoiler. Se a leitora ainda não viu o filme THE MATRIX <www.whatisthematrix.com>, em cartaz nos melhores cinemas, não deixe de assisti-lo. Para quem é chegado à informática e adora Internet, tecnologia, efeitos especiais e filmes de Kung Fu, o filme é realmente imperdível. Visite também <http://us.imdb.com/Details?0133093>. Mas se não quiser saber de comentários antes de conferir a película, interrompa a leitura deste artigo imediatamente, guardando-o para ler depois.
Já fui ver THE MATRIX três vezes, a primeira delas a convite do provedor Matrix <www.matrix.com.br>. Pretendo ainda ver o filme no mínimo mais uma vez, pois ainda não consegui pescar tudo que queria.
THE MATRIX é mais uma advertência quanto aos perigos da Inteligência Artificial, com respeito à possibilidade de um dia as máquinas vencerem o homem numa batalha final. É uma sucessão de metáforas maravilhosamente bem sacadas, sobre o grande "Sistema" que comanda nossas vidas. O enredo se passa 200 anos no futuro, tempo em que as pessoas não nascem naturalmente, mas sim são cultivadas por máquinas e passam a vida inteira dentro de casulos, imersas numa gosma rosa, com conectores elétricos plugados pelo corpo inteiro, recebendo impulsos nervosos programados por uma central onde roda um software ultra-complexo chamado The Matrix (A Matriz). Este programa dá à criatura a ilusão de que está vivendo em 1999, num mundo que é rigorosamente igual a esse em que vivemos. Portanto, bem que poderia tudo isso ser verdade, e nós estaríamos vivendo uma existência totalmente virtual nesse exato instante.
Mas se prestarmos atenção, o enredo do filme nem é tão louco assim. A rigor, a alma de cada um de nós apareceu aqui na Terra vinda não se sabe de onde. Começamos como nenens molinhos e indefesos, desde cedo submetidos a uma torrente fabulosamente caudalosa de informações, padrões, preconceitos, códigos, barreiras, valores, exemplos e regras de conduta. Antes de começarmos a falar, já estamos simbolicamente plugados no sistema e, quando nos damos por gente, a quantidade de subrotinas e funções já carregadas em nosso hardware cerebral e anímico já é tão gigantesca, que na maioria das vezes a pessoa perde totalmente o contato com sua verdadeira essência, passando a viver o resto da vida em cima de trilhos previamente definidos pelo sistema.
Escapar dessa monstruosa malha é quase impossível. Quando um raro indivíduo começa a pôr as unhinhas de fora, despertar do sonho e tentar sair do casulo, desplugando-se da Matrix, logo aparece um "agente". Agentes, no filme, são uns caras engravatados, super-poderosos e meio mágicos que dão tiro pra todo lado e se manifestam através de qualquer habitante não desperto, dentro do ambiente virtual do grande software. Experimente você mesma, leitora. Saia na rua peladona, pintada de verde, rasgando dinheiro e gritando em altos brados o que pensa sobre as injustiças sociais. Ou então, se for mais discreta, aja em sua vida toda de acordo com o que intimamente achar correto e lhe fizer realmente bem. Logo aparecerão os agentes, sempre prontos a coibir desvios na Matrix, logicamente sem aqueles óculos escuros, prendedores de gravata e ponto eletrônico com fiozinho espiral espetado no ouvido.
O filme foi rodado em Sydney, Austrália, com cenas externas cheias de logomarcas e cartazes fictícios. Mas o merchandising come solto, com (proibidas) mensagens subliminares a torto e a direito: bateria Duracell, celulares Nokia que abrem com barulho de canivete, automóvel Lincoln Continental e, perto da cena final em que o sensacional agente Smith é atropelado pelo metrô, descaradamente aparece na parede, numa fração de segundo, um tremendo logo da Hewlett-Packard. Mais trivia em <http://us.imdb.com/Trivia?0133093>
Um amigo meu foi assistir ao filme junto com uma pessoa que tem comprovada clarividência astral. Ela garantiu que quem escreveu o roteiro também "vê", ou então foi assessorada por quem "via". Isso é bastante óbvio, mesmo para os que apenas estudam o assunto, independente do visual astral das cenas. Os plugues do casulo estão nos nódulos da espinha e em cima de vários chakras espalhados no corpo. Aquele enervante conector ponteagudo que era a ligação principal entre os despertos e o sistema pirata que permitia que entrassem na Matrix, entrava no corpo exatamente no lugar certo, ou seja, na nuca. Segundo os videntes, que sabem que é por ali que entram as energias cósmicas na gente, os roteiristas só erraram no ângulo de penetração espinha adentro, que deveria ser de 45 graus.
As metáforas não param de bombardear o espectador, que fica de cabeça quente ao sair da sessão: o despertar interno; o oráculo que surge como uma dona de casa; o poder da mente; a mentira do oráculo para o Escolhido; a sacada do "deja vu" do gato preto; o poder do amor fazendo reviver o Neo; o querer é poder... É tanta coisa que tenho que ver esse filme de novo. Talvez descubra porque é que o diabo do "operator" sempre arranja um telefone que fique tão longe e inacessível para os heróis, invariavelmente numa esquina sombria ou no enésimo andar de um prédio imundo.
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