O GLOBO - Informática Etc. - Carlos Alberto Teixeira
Artigo: 418 - Escrito em: 1999-08-24 - Publicado em: 1999-08-30


Galeria de desfigurações


A moda é adulterar páginas em sites Web

Com a crescente e nem sempre necessária complicação e agigantamento dos pacotes de software, a incidência de bugs nestes programas vem aumentando assustadoramente. Na pressa de lançar uma nova versão, os desenvolvedores, muitas vezes conscientemente, pulam etapas importantes na fase de testes e, como resultado, o produto sai bichado para o mercado. Os softwares de servidores Web são um claro exemplo disso. A todo instante anuncia-se a descoberta de um furo neste ou naquele servidor. Se as empresas responsáveis pudessem, bem que não levariam a público informações tão humilhantes, mas acabam tendo que fazê-lo para não verem seus prejuízos ainda maiores mais tarde. A conseqüência imediata é que os hackers entram de cabeça nos furos, invadindo loucamente todo site que puderem encontrar, que esteja rodando o tal servidor defeituoso, e cujo sysadmin
ainda não tenha corrigido a falha.

Assim, tornou-se moda desfigurar sites Web. A ânsia de ter o nome arquivado em alguma galeria de hackers heróis toma por completo o espírito dessas criaturas, geralmente jovens em busca de afirmação. Não é modismo brasileiro não, afeta a rapaziada no mundo inteiro. E não me venha a leitora dizer que todos são um bando de malfeitores, facínoras e desocupados, pois não o são. Tem muito articulista de informática, por exemplo, que começou sua carreira fuxicando sistemas, surrupiando senhas e cavando acessos não-autorizados a sites fechados. Muito embora seja uma prática reprovável, essa coisa de hackers furando sistemas tem lá seu lado benéfico, pois força os administradores a se manterem atualizados e sempre atentos. Infelizmente, esta tensão constante é a causa de vermos muito sysadmins, ainda na casa dos trinta, com a cabeleira já toda grisalha.

De qualquer modo, não se pode negar que é até divertido visitar um site supostamente sério, confiável e tradicional, e encontrá-lo invadido, ostentando uma tela desfigurada, contendo impropérios e citações idealistas ou anárquicas, geralmente mal escritas e com um cheirinho forte de amadorismo juvenil. Acontece que em pouco tempo as telas originais são recolocadas no ar e a graça logo se acaba. Contudo, para glória dos adulteradores, existem sites que arquivam quase todas essas invasões bem sucedidas, salvando as telas modificadas para a posteridade. O melhor exemplo deles é o Attrition <www.attrition.org/mirror/attrition> que oferece, para cada mês, uma extensa lista de desfigurações de sites amplamente documentadas, com links para a versão adulterada, para a página original e (é claro) uma menção ao autor da façanha.

Nesse meio, nossos hackers brasileiros não são pouca josta não. Atuando sozinhos ou em grupos, destacam-se: #orelhao, LSS Services, xHg e blOw team. Esta última equipe, só nos últimos meses, desfigurou um monte de sites de peso, como: USDA Food and Nutrition Service, US Forest Service, USDA Food Safety and Inspection Service, Estado de Mato Grosso, USDA Rural Development, Estado de Santa Catarina, Centro de Informática e Automação do Estado de Santa Catarina S.A., Top Access, Universidade de Albany, Evolução, 2600 UK, Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia, Telemar, NASA Ames Research Center Document Server, Ministério da Previdência e Assistência Social, Faenquil, Fundaj e Symantec.

No que tange à tecnologia, as páginas do Attrition são um exemplo a ser seguido. Aderem rigidamente ao padrão "texto-puro", sem gráficos, frames, firulas, javas, nem quaisquer outras frescuradas do tipo. Foram projetadas para o velho padrão das 80 colunas por tela e tendo em mente o conteúdo, deixando a estética em segundo plano. O que se tem é um site com fundo preto, letras brancas em Courier New e links em vermelho. Limpo, objetivo e rápido.

Outra seção muito interessante no site oferece a errata da cobertura jornalística sobre segurança em informática. Visite <www.attrition.org/errata> e aproveite o trabalho da equipe em alertar sobre erros, mentiras e charlatães na indústria da segurança em computadores. Uma vez que a velocidade dos acontecimentos nessa área é avassaladora, muitas vezes a leitora não tem como acompanhar e verificar informações que lhe chegam oriundas das mais variadas fontes. O efeito disso é que a população interessada freqüentemente é mal informada sobre vírus, hackers, phreakers, crackers, privacidade e segurança em geral. A equipe do Attrition não poupa ninguém e baixa o sarrafo na mídia atrapalhada, nos livros imprecisos, nos falsos sábios e nas estatísticas inventadas, fenômenos muito comuns nesse meio.

Mas o grande tesouro do Attrition é sua soberba coleção de textos ascii, versando sobre os mais variados tópicos do submundo da computação em rede. É um verdadeiro acervo histórico, trazendo desde obras primas de 1979 até textos recentes. A gama de assuntos é rica e vastíssima, incluindo: bugs em programas, cable modems, CDC (cult of the dead cow), cracking de software, criptografia, e-mail, ética, FAQs, jargão, Netware, notícias de hacking, revista Phrack até dezembro de 1998, RFC (requests for comments), scripts de hacking, segurança, telefones celulares, textos sobre hacking, textos sobre phreaking, Unix, vírus e zines.

As páginas do Attrition são mantidas por cinco humanos: Cult_hero (Jericho), Cancer Omega (cOmega), Modify, Punkis e McIntyre, todos negros. Além disso, contam com a ajuda da sensualíssima Mal_Vu. Visite o site e veja a foto dessa maravilhosa mulher-bot branca, cabelos negros, submissa, estrela de mais de 170 filmes pornô, considerada a mais perigosa peça de software viva. Sim é claro, você adivinhou: ela é um programa, um "bot" (roBOT) de IRC.


[ Voltar ]