O GLOBO -
Informática Etc. - Carlos Alberto Teixeira
Artigo: 431 - Escrito em: 1999-11-24 -
Publicado em: 1999-11-29
Retorno às origens
Sofisticação num site não é sinônimo de qualidade
Certa feita, chegou-me um amigo e descarregou em cima de mim, num almoço lá no Centro, uma série de preocupações sobre um assunto ligado à Web e pediu minha opinião. Há coisa de um ano, ele havia sido chamado para produzir um web site informativo para uma empresa de turismo. Nada de vendas online, apenas tabelas de preços, normas técnicas, perguntas e respostas, pacotes de viagem, endereços de filiais, FAQ's e coisas do tipo. Ele fechou o contrato e preparou o site, que ficou super jeitoso e até meio refinado, com uma programação visual leve e simpática, boas sacadas de DHTML e umas coisas em Flash. Mas o meu camarada, há poucos meses, recebeu a notícia de que o site estava sendo pouco visitado pelas agências de turismo e seus clientes estavam insatisfeitos, querendo fazer um site novo, avançado -- diziam. E mais: eles queriam Java, apesar de nem saberem direito o que é. Para tanto, estavam convidando outros consultores e empresas a apresentarem propostas de melhoria ou reconstrução do site, fazendo a gentileza de convidar este meu amigo a também participar dessa concorrência. Ele entrou em pânico e pediu minha ajuda.
Examinei o site do mancebo e achei-o realmente muito bom. Obviamente, se as pessoas não o estavam visitando não era por causa da sua aparência nem do seu conteúdo. Mas meu amigo insistia que os outros concorrentes iriam aparecer com páginas altamente sofisticadas e cobrando um preço bem menor para produzi-las, pois conhecia alguns de seus competidores.
O que vemos aqui são dois fenômenos acontecendo em paralelo. O primeiro deles diz respeito ao barateamento de serviços desse tipo. Quando surgiu a Web, cobrava-se os olhos da cara de quem quisesse ter uma boa página na Rede. Todavia, com o passar do tempo, em qualquer livraria passou-se a encontrar bons livros ensinando como construir sites. A conseqüência foi o gradativo inchamento do mercado, pois um serviço que era prestado pelos pioneiros e que custava caro, passou a ser feito por novatos, bem mais barato, mas muitas vezes com uma qualidade bem mais capenga. Ao mesmo tempo, os clientes em potencial para este tipo de serviço foram ficando também cada vez menos exigentes e mais sovinas. Com isso, os fornecedores de produtos finais de alta qualidade e alto custo foram quebrando. É o que estava acontecendo com o meu amigo. Ele queria manter o seu elevado padrão de qualidade, mas segurando o preço antigo. Quanto a isso não havia outro jeito: ele tinha que cobrar menos. Por sorte ele topou.
O outro fenômeno é que muita gente plugada, pelo menos aqui no Brasil, ainda acredita que um web site só é bom se tiver muitas imagens, banners animados, frames, HTML dinâmico e animações. Essas pessoas estão dando mais importância à forma do que ao conteúdo e aos objetivos reais do site. É uma abordagem controvertida pois, ao mesmo tempo que várias perfumarias estéticas, algumas delas interessantíssimas, estão sendo introduzidas no dia-a-dia da Web, outras correntes dão preferência a sites com mais substância e menos firulas.
Se navegarmos por aí, veremos que muitos sites lá fora que começaram frenéticos e hollywoodianos abandonaram essa estética dos letreiros de neon e adotaram um visual tendendo ao texto-puro, com muito menos imagens. O próprio uso de frames tem sido impressionantemente menor de uns tempos para cá. Essa tendência mais recente ainda é pouco vista em sites brasileiros, ainda apegados às idéias "antigas". Muitas empresas nacionais têm páginas que chegam a irritar os internautas, de tanto pisca-pisca e bobajada. Junte-se a isso a febre dos banners. Leitora, diga-me lá: quantas vezes você já clicou num banner ao visitar um site? Muitas? Sempre clica? Ou apenas raramente?
No caso do meu amigo, os clientes estavam deslumbrados com as vastíssimas possibilidades que a Web oferece e começaram a querer incluir no site um monte de funções que não estavam diretamente ligadas ao objetivo primordial das páginas, tipo oferecer área de chat, livro de visitas e música de fundo.Se o site não estava sendo visitado, mas tinha um bom projeto visual e atendia às funções originais do projeto, então só havia um motivo para isso acontecer: as pessoas que deviam acessá-lo não sabiam da existência dele. Meu amigo pensou em jogar um spam para captar a atenção das agências, mas recomendei que não o fizesse. Resultado: ele pediu ao cliente para adiar um bocado a concorrência, investiu numa mala direta por via postal e enviou para as agências de turismo um informativo impresso com ótimo visual, leve, conciso e direto, apresentando o site, as facilidades que oferecia e pedindo um feedback via email. Foi um chuá. Em pouco tempo, viu os page-views aumentando bastante e algumas agências dando ótimas sugestões de melhoramentos para as páginas. No final das contas não houve a tal concorrência e as páginas ficaram com o mesmo conteúdo e quase com a mesma cara de antes. Só não ficaram idênticas porque ele tirou alguns dos "avanços" tecnológicos para acelerar a carga do site na tela dos visitantes. Em suma, deu apenas uns passos a mais na direção do ideal de alguns, ou seja: páginas em HTML puro, limpas, leves, com mais informação concreta e menos imagens pesadas.
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