O GLOBO -
Informática Etc. - Carlos Alberto Teixeira
Artigo: 433 - Escrito em: 1999-12-06 -
Publicado em: 1999-12-13
O segredo das copiadoras coloridas
O número de série da máquina é inserido em cada cópia
No dia 20 de novembro passado, um cidadão americano de nome J. J. Johnson www.jj-johnson.com/co piers.htm> teve problemas burocráticos e precisou tirar uma cópia colorida de sua carteira de motorista. O funcionário da copiadora se recusou a fazer a cópia alegando que reprodução colorida de documento oficial era ilegal, pois poderia dar margem a falsificações. Para surpresa do JJJ e de todos os outros clientes presentes na loja, o funcionário explicou que as copiadoras em cores colocam códigos invisíveis nas cópias, que incriminariam aquela copiadora. Imediatamente, tocou o maior barata-vôa dentro do estabelecimento, com todo mundo querendo saber que diabo era aquela história. O próprio JJJ se indignou e saiu perguntando pela Internet se aquilo era verdade.
Na Web muito pouca coisa pode ser encontrada, como no site <www.parascope.com/articles/0197/xerox.htm>. No final das contas é tudo verdade, ou pelo menos os fabricantes querem que achemos que é. Segundo Richard Longcoat, engenheiro de impressoras coloridas a laser da Xerox, estes equipamentos inserem na imagem um código criptografado que contém o número de série da impressora. Motivo: a máquina poderia ser usada para falsificar dinheiro, ações e papéis oficiais, entre outros. Segundo Richard, tanto a Xerox quanto todas as outras fabricantes de copiadoras coloridas e impressoras em cores de alta qualidade têm um acordo com o Departamento do Tesouro Americano no sentido de inserir estes códigos de modo a facilitar investigações.
Surpreendentemente, este fato era ainda pouquíssimo conhecido, raras vezes circulando na Rede como mais uma dessas lendas urbanas que se vê por aí. A divulgação era propositadamente escassa para que os falsários pudessem ser pegos desprevenidos e agarrados depois pelo longo braço da lei. Contudo, nos últimos dias, a questão dos códigos secretos nas copiadoras levantou tanta discussão entre os grupos preocupados com assuntos de privacidade, que a informação vazou e agora ninguém segura mais. Há quem acredite que no código secreto também aparece o contador interno de cópias como informação adicional, mas não se tem ainda confirmação disso. Agora que a coisa caiu na boca do povo, receia-se que os marginais consigam quebrar o código secreto e que a tecnologia de codificação acabe sendo desvendada, anulando a medida de proteção até que se bole coisa melhor.
A notícia foi quicando pela Rede até que caiu nas mãos de Lauren Weinstein <[email protected]>, moderador de um fórum sobre privacidade na Internet, que por sua vez caiu fundo na investigação e foi bater direto num especialista antifalsificação da Xerox, que confirmou a existência dos códigos.
Toda cópia colorida, de qualquer fabricante, tem mesmo um identificador invisível impresso, sem que o cliente final disso tenha conhecimento. Impressoras coloridas também inserem o ID. A preocupação com a possibilidade de se falsificar grana com essas máquinas surgiu no Japão, onde elas primeiro foram produzidas. As primeiras soluções foram extremamente deselegantes: as unidades tinham o número de série gravado do lado de dentro do vidro de cópia, imprimindo a informação em todas as reproduções. Mas isso foi só até que implementassem métodos mais sofisticados. Atualmente, o identificador é repetidamente impresso como um leve "ruído" ao longo de toda a imagem, impedindo que um falsário espertalhão aproveite apenas pequenos pedacinhos da cópia.
Para ler este ID, o documento é scanneado e o tal ruído especial é decodificado através de um algoritmo altamente secreto de posse de cada fabricante. No caso de máquinas Xerox, só a própria empresa tem os meios para isso e o faz mediante ordem judicial ou a pedido de determinadas agências governamentais para as quais tais mandados não são exigidos. A cada semana, a Xerox recebe uma ou duas requisições deste tipo, nos EUA.
Nas máquinas em preto e branco (ainda) não existe este código secreto, mas é possível que venha a ser implementado também em impressoras jato de tinta. Tentaram inserir também data-hora nas reproduções, mas deram com os burros n’água, porque não dava para garantir que o clock da impressora ou do PC estivessem sempre certos.
Outra medida de proteção é derramar mais tinta ciano quando a máquina "desconfia" que está sendo feita reprodução de dinheiro. Todas essas técnicas até que deram certo, pois registrou-se nos EUA uma queda de 30% nas tentativas de falsificação usando copiadoras, depois que estes procedimentos propositalmente vazaram dos fabricantes. A leitora certamente se pergunta que tipo de otário aceitaria uma cédula falsificada assim, mas o serviço secreto americano tem amostras de falsificações grotescas que enganaram muito trouxa por lá, algumas feitas até com impressoras matriciais daquelas bem furrecas.
As implicações dessa novidade (pelo menos para mim é coisa nova) são bem graves, indo direto ao centro das discussões sobre privacidade. Nada impede que, em poucos anos, seja sigilosamente inserido nos circuitos das copiadoras e impressoras um minúsculo chip GPS (Global Positioning System), capaz de dar as coordenadas geográficas em latitude e longitude do ponto em que se localiza a máquina, e que esta informação também esteja impressa como ruído criptografado na imagem reproduzida. Estes conceitos começam a sair do âmbito da ficção científica para cair no conjunto das possibilidades reais. Não demora muito para que tecnologias assim escapem ao controle dos órgãos governamentais e comecem a ser usadas para fuxicar ainda mais a intimidade do cidadão. É nosso dever ficar alerta para que possamos nos prevenir contra possíveis abusos.
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