O GLOBO - Informática Etc. - Carlos Alberto Teixeira
Artigo: 463 - Escrito em: 2000-07-12 - Publicado em: 2000-07-17


Internautas em cenas noturnas


O manto da noite reserva surpresas para adeptos da Rede

Durante uma conferência mundial de webmasters, um dos palestrantes teve sua atenção dirigida a uma das moças na platéia. Quase perdeu a fala quando a viu. Era um sujeito tímido, sem prática de falar em público, de modo que a visão deslumbrante o perturbou completamente. No entanto, graças a um esforço de concentração, conseguiu retomar o fio da meada e prosseguiu na sua explanação sem maiores problemas. A jovem, essa sim, certamente percebeu a olhada penetrante do sujeito. Terminada a apresentação, ele mal conseguia tirar a imagem da beldade de sua cabeça. Mas vieram os perguntadores de sempre e a dona escapuliu. Ela era elegante, bem vestida, fina, charmosa e lindíssima. No entanto, aparentava ser muito mal-humorada e de difícil acesso.

Na correria da conferência, acabaram por não toparem mais um com o outro, que pena. Terminou o evento e os participantes se dispersaram, cada um voltando para seu estado, de carro, avião ou trem. Pois bem, foi no trem que nosso palestrante calhou de dividir o quarto justamente com a deslumbrante mas carrancuda moça da platéia. Dois webmasters na mesma cabine. O coração do cara quase pulou pela boca mas, tímido que era, não teve peito para dar a óbvia investida.

Depois do desconforto natural de dois desconhecidos numa mesma cabine de trem, meteram-se a dormir, ele na cama de cima, ela na de baixo. Não trocaram palavra nesse meio tempo e pegaram no sono, primeiro a mulher e, muito depois, o cidadão, que estava super excitado com aquela presença magnífica logo abaixo de si.

Lá pelo meio da noite, o camarada não pôde mais se conter e resolveu acordar a mulher com alguma desculpa esfarrapada. Escusou-se por acordá-la mas disse que estava morrendo de frio e pediu que, por gentileza, ela lhe passasse o cobertor que estava numa prateleira perto dela, junto ao chão.

A moça respondeu dizendo que tinha uma idéia melhor: "Que tal se, apenas por essa noite, nós dois fingíssemos que somos casados?" O cara se levantou surpreso e, após dar uma cabeçada no teto da cabine, respondeu imediatamente que topava. Ao que respondeu a mulher: "Então tá... vai pegar você mesmo o cobertor, seu inútil!"


Certo menino costumava ficar diariamente surfando na web à noite. Começava logo depois do jantar e, já tarde, os pais tinham que arrancá-lo quase à força da máquina para dormir. Como era de se esperar, o garoto, com a mente agitada pelas navegações, custava a pegar no sono. E isso lhe causava sérios problemas: chegava ao colégio todo dia de manhã com um olho rôxo. Seu melhor amigo, também internauta compulsivo, percebeu que algo andava errado e, após algumas semanas com a situação matinal se repetindo, acabou por interpelar o companheiro. A muito custo, nosso menino esclareceu o que se passava.

Toda noite, depois de ser forçado a se desplugar da internet e desligar a máquina, ele era posto para dormir. Não tinha sono nenhum, é claro. Família modesta, dormiam eles todos no mesmo quarto: pai, mãe, o garoto e um irmãozinho nenem. Deitavam-se, em geral, lá pela meia-noite. Passava-se meia-hora e o pai perguntava se o menino já estava dormindo. Ele respondia que não. Mas outro tanto e o pai, já meio enfezado, repetia a pergunta. Neca de pegar no sono o guri. A cada pergunta o pai subia o tom de voz, fazendo o nenem acordar e chorar. Mais estresse. Depois de várias repetições da cena, lá pelas duas da madrugada, o pai já estava furioso e perguntava berrando ao moleque se já tinha dormido. Meio choramingando, pois sabia o que estava por vir, o garotinho confessava que ainda estava acordado. E o desfecho era sempre o mesmo. O pai, malvado por certo, pulava da cama e, vociferando impropérios, enfiava um murro na cara do menino, que desfalecia no ato. No dia seguinte, lá estava o pobre, com o olho inchado e roxo no colégio. Era uma rotina de dar dó. E o pior é que os pais não sacavam que a solução seria simplesmente tirar o garoto mais cedo da frente do micro e acalmá-lo com alguma atividade mais relaxante, antes de irem todos dormir.

Penalizado diante de tanta crueldade, o amiguinho do guri insone propôs-se a remediar a situação, sugerindo que o sofredor mentisse para o pai. Assim que ele lhe perguntasse se estava a dormir, bastaria que ficasse quieto, fingindo-se adormecido. Se o pai insistisse, nada de temores, apenas silêncio absoluto. E assim, não seria esmurrado. Simples como quê. O garoto entendeu a dica e foi para casa, mas não sem antes dar um terno abraço de gratidão no seu amigo tão inteligente.

No dia seguinte, para espanto geral, chegou o pobre menino ao colégio, ainda soluçando. Tinha os DOIS olhos roxos. O problema que ele enfrentava toda noite já era do conhecimento dos coleguinhas e, em sinal de respeito, ninguém ousou perguntar o que havia se passado daquela vez. A única exceção foi o bom amigo de sempre, aquele da solução brilhante. Ele veio ter com o garoto agredido perguntando se havia seguida à risca a dica do silêncio sepulcral. Com o rostinho triste e a voz quase chorosa, o menino respondeu: "Segui direitinho o seu conselho. Me tiraram da internet, escovei o dente, botei o pijama e fomos todos deitar. Depois dum tempo o papai perguntou se eu tava dormindo e eu fiquei calado. Depois de mais um tempinho ele perguntou de novo. Continuei caladinho. Ai, eu não entendi mais nada. Eu tava quase dormindo e comecei a ouvir a mamãe gemendo. Achei que ela tava passando mal. Depois o papai começou a gemer também. Fiquei assutadão. Os dois gemendo, tudo escuro, eu morrendo de preocupação. De repente o papai disse com uma voz meio esquisita -- estou indo meu bem, estou indo! E a mamãe respondeu meio rouca -- também tô indo meu bem, também tô! Aí eu não agüentei e falei -- Também quero ir, não me deixa aqui sozinho não!"


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