O GLOBO - Informática Etc.
Carlos Alberto Teixeira - C@T

Wi-Fi versus Bluetooth

Artigo: 515

Sobreposição de freqüências é promessa de confusão vindoura

Publicado em:  2001-09-10
Escrito em:  2001-09-06

 

É importante que a leitora tome cuidado ao usar ao mesmo tempo telefone sem-fio, controle remoto de porta de garagem, forno de microondas, dispositivos Bluetooth e redes locais sem-fio. Algumas dessas emissões são até bem comportadinhas, mas outras chegam a ser ameaçadoras. Nem falo dos efeitos da radiação sobre nossos corpitchos, mas sim da briga entre as normas. É o caso do tão afamado Bluetooth, um padrão de interligação de dispositivos por radiofreqüência usando chipzinhos embutidos em grande variedade de aparelhos do dia-a-dia dos geeks. Bluetooth promete se transformar em séria ameaça às redes 802.11b, conhecidas como Wi-Fi. A rota de colisão entre essas duas tecnologias já está traçada e o glub-glub de uma delas é apenas questão de tempo.

Bluetooth foi bolado pela Ericsson e acabou se transformando em padrão adotado pela maioria dos peixes grandes fabricantes de aparelhinhos wireless. Eliminando os fios, ele permite interligação entre dispositivos que se situem dentro dum raio de alcance de 3 metros. Do outro lado do campo de batalha está o Wi-Fi, um padrão usado para conectar PCs e notebooks a uma rede de computadores, também sem necessidade de fiação. Tem sido utilizado por empresas e usuários domésticos mais safos para interligar num só ambiente vários computadores sem a chatice de sair passando cabos pra lá e pra cá. Destarte, podem compartilhar dados, impressoras e até conexões internet banda larga. Wi-Fi é a mais recente febre nos EUA e Europa, transmitindo dados até a 11 Megabits por segundo numa boa, com taxa real de transmissão de cerca de 7 Mbps. Outro dia vou até contar pra vocês alguns lances curiosos do folklore Wi-Fi.

Mas atenhamo-nos ao caos que se configura no horizonte. Quem nos explica a encrenca é Andy Walker do site CyberWalker. A confusão começa quando um dispositivo Bluetooth se aproxima de um gateway Wi-Fi. O problema é de interferência. O link Bluetooth pula para cima das freqüências da rede wireless e pode até derrubá-la, tal o ruído que se produz. Tudo se dá no espectro não licenciado da faixa dos 2,4 GigaHertz. Basta pensar nessa banda de freqüências como se fosse um cano bem grosso dentro do qual temos um feixe de fios comuns de telefone. Quando se envia dados por um desses fios imaginários, o aparelho transmissor se apropria de um canal de freqüências e manda informações através dele. Na banda de 2,4 GHz existem 83,5 desses canais, dos quais 79 podem ser usados pelo Bluetooth. O Wi-Fi, por seu turno, usa 22 canais. Teremos então, certamente, alguma sobreposição.

O padrão Wi-Fi, educadinho que é, pula de canal duas vezes por segundo, mas antes dá uma olhadela para ver se o novo canal está livre ou está sendo usado por alguma outra transmissão. Já o Bluetooth é estúpido, grosseiro e brutamontes. Ele varia de canal 1.600 vezes por segundo e não quer nem saber se o novo canal está em uso ou não. Simplesmente pula pra dentro dele e sai usando tranqüilamente. Ou seja, se já houver uma conexão Wi-Fi em andamento ela tem altas probabilidades de cair ou então de ir se degradando, diminuindo a velocidade de transmissão e refazendo tentativas de reconectar, o que inviabiliza o transporte de dados.

Em termos práticos, suponha que você está usando uma rede wireless Wi-Fi para acessar a internet, por exemplo, fazendo download de um documento ou assistindo a um stream de vídeo. De repente entra na sala sua colega com uma agenda eletrônica Bluetooth na bolsa. O PC desktop dela dentro da mesma sala, aparelho também bluetoothzado, percebe a chegada da beldade e começa a intercambiar dados via radiofreqüência com a agenda, sincronizando as informações de ambas. Sabe o que acontece com a sua conexão Wi-Fi com a internet? Um abraço: ela vai ficando irritantemente lenta. Um vídeo stream viraria um slideshow e sua conexão poderia até cair.

Espera-se que em três ou quatro anos, qualquer zebedeu plugado vá ter junto a seu corpo uns três aparatos eletrodigitais com chip Bluetooth embutido: celular, agenda, relógio, laptop, pager, tanto faz. Imagine agora uma cidade com milhões de chips assim zunindo na faixa das microondas. Agora pegue um time de futebol e faça os jogadores, todos abonados e high-tech, entrarem num prédio cheio de redes wireless Wi-Fi. Já sabe o que vai acontecer, não sabe?

Obviamente a indústria wireless está perfeitamente a par deste impasse. A segunda geração de chips Bluetooth talvez venha a obedecer a um padrão menos brutal. No entanto, essa mudança de norma implicaria num maior custo de fabricação e os caras do Dente Azul (blue tooth), que já estão suando sangue para baixar o preço unitário do chip para algo menor que os atuais US$ 5,00, não vão gostar nada dessa idéia.

Outra saída é deslocar o tráfego Wi-Fi, arrancando-o da faixa dos 2,4 GHz e ocupando alguma outra área do espectro. Aí sim, vão lavar a égua, pois com uma banda bem larga onde espalhar os canais, vai ser um chuá transmitir multimídia pesada. Imagine que beleza a leitora ter um pratinho de antena satélite ou uma caixa de TV a cabo e poder distribuir sem-fio seu sinal de TV de alta-definição por todos os seus quartos, salas, banheiros e cozinha usando uma futura variante do padrão Wi-Fi. Quem sabe eles não adotarão o padrão 802.11a, que tem uma largura de banda entre 12 e 54 Mbps? É que ele opera na faixa dos 5 GHz, bem longe da mixórdia do Bluetooth. Vai ser um paraíso. Mas eu quero uma gaiola de Faraday só pra mim.


Notou que até agora não escrevi nenhum URL aqui na coluna? Pois é. Estou experimentando juntar todos os links num lugar só, lá na web. Os links de hoje, por exemplo, você encontrará todos eles em <http://groups.yahoo.com/group/infoetc/files/art515-links.txt>. Mas como aqui estamos na web, poupo o seu trabalho:

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