|
Solidão na madrugada |
|
Artigo: | 530 |
Quem mais sofreu foram as unidades de disco |
Publicado em: | 2001-12-24 | |
Escrito em: | 2001-12-20 |
Muitos dos problemas de segurança em sistemas de computação são causados por funcionários da própria instalação. M. E. Kabay, professor associado do departamento de computação da Norwich University em Northfield, Vermont, nos conta sobre um dos mais interessantes casos de sabotagem em computadores. Ele teve lugar há 30 anos, no centro de processamento de dados (CPD) da National Farmers Union (Sindicato Nacional de Fazendeiros), em Denver, nos EUA. Um mainframe Burroughs B3500 parecia estar mal-assombrado. Como se sabe, a cabeça de leitura e gravação de um disco rígido nunca se encosta à sua superfície metálica -- fica voando bem pertinho dela. Se por acaso encostar, é o que se chama "crash", um dos piores acidentes que pode ocorrer numa unidade. Pois bem, de 1970 a 1972, o tal B3500 havia sofrido 56 crashes de disco, ficando fora do ar cerca de oito horas a cada evento. Os técnicos da Burroughs inicialmente acharam que o problema se devia a flutuações de energia elétrica e começaram a trabalhar em cima desta hipótese. Nesse meio tempo, fora o prejuízo operacional, gastou-se mais de US$ 2 milhões recabeando o computador e testando os circuitos, mas os crashes continuaram.
Os analistas começaram a investigar mais a fundo a questão, percebendo que todos os crashes ocorreram à noite, justamente na escala de serviço de um mesmo operador, o velho Albert. Mesmo sendo ele incrivelmente prestativo e amigável, a gerência resolveu instalar em segredo uma câmera de circuito fechado de TV dentro da sala principal do CPD. Depois que o crash seguinte aconteceu, a fita gravada mostrou Albert abrindo a (monstruosa, para os padrões atuais) unidade de disco e enfiando a chave de seu carro na bobina de gravação, fechando um curto-circuito e causando o 57º crash de cabeça.
Na manhã seguinte, a gerência confrontou Albert com os filmes e cobrou dele uma explicação. O velhote desabou, num misto de vergonha e alívio, confessando que sofria de uma obsessiva compulsão por desligar o computador. Na investigação psicológica que se sucedeu, concluiu-se que Albert, que vinha sendo alocado há anos ao mesmo horário noturno, havia se tornado simplesmente um solitário. Ele chegava ao serviço exatamente quando todos os outros estavam voltando para casa. Horas, dias e meses iam passando sem que ele interagisse com nenhum ser humano em seu trabalho. Era só a mesma sala gélida e os afazeres de sempre, ao lado daquela máquina sempre zumbindo. Albert nunca participava de cursos, nem de comitês, não batia papo e nunca se sentia envolvido com os outros na empresa. Quando os primeiros crashes de disco aconteceram, foram acidentais mesmo. Mas ele ficou surpreso e excitado com a chegada da equipe de reparos. Sentiu-se então útil, alvoroçando-se e contando aos técnicos, em detalhes, o que havia acontecido. Quando os crashes se tornaram menos freqüentes, Albert, involuntária e quase inconscientemente, tratou de recriar a atmosfera amigável e participativa junto à equipe de emergência da Burroughs. Ele destruía os drives porque precisava de companhia.
O caso subiu à cúpula do sindicato e, no final das contas, foram os gerentes que acabaram levando a culpa, por terem relegado o funcionário a uma incumbência vazia, sem pensar em sua carreira nem em seu moral. Bem, nem por isso Albert deixou de ser demitido. Foi para a rua mas, pelo menos, não teve que pagar pelo prejú.
O caso é antigo, mas serve perfeitamente para os dias de hoje, no sentido de demonstrar a forma mais sábia de prevenir sabotagem interna. Basta estar atento às relações com os funcionários. Segundo o Prof. Kabay, se Albert tivesse participado de um rodízio com os outros operadores no turno da noite, sua empresa teria deixado de gastar uma boa nota. Diretores e gerentes devem ficar de olho vivo, supervisionando o estado mental e de ânimo de seus empregados, especialmente nessa área de sistemas de informação. Muita atenção a problemas pessoais, doenças graves na família, encrencas de grana e coisas do tipo. É preciso manter um sistema informal de conversa para detectar o mais cedo possível comentários amargos sobre o sistema de informática, condições de trabalho, e conflitos com outros funcionários e com a gerência. A melhor saída nesses casos é sentar e conversar. Assim, estarão sendo resolvidos os problemas, antes que deteriorem a ponto de um ataque físico aos sistemas. No caso de uma instalação de computadores particularmente sensível às questões de segurança, o Prof. Kabay recomenda também que se coloque discretamente câmeras em todos os lugares-chave da empresa, monitoradas 24 horas por dia por pessoal de segurança ou mesmo por uma empresa externa terceirizada. Particularmente, Deus me livre de trabalhar num buraco desses. E, falando Nele, hoje à noite comemora-se 2002 anos do nascimento de Seu filho. Boas festas!
[ Voltar para o índice de artigos de 2001 ]
[ O
Globo | Informática Etc.
| coluna
mais recente | enviar email |
página
pessoal C@T | assinar
lista InfoEtc | assinar
GoldenList do C@T ]